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Carpinteiros taipenses falecidos no norte e centro de Portugal (1712-1724)

António José Oliveira
Opinião \ sexta-feira, outubro 06, 2023
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Com vista ao estudo da História de Arte vimaranense nos séculos XVI a XVIII, consultámos manuscritos que julgamos de extrema importância para a história dos ofícios e mesteres das Caldas das Taipas.

Ao realizarmos a nossa pesquisa no Arquivo Municipal Alfredo Pimenta, com vista ao estudo da História de Arte vimaranense nos séculos XVI a XVIII, consultámos manuscritos que julgamos de extrema importância para a história dos ofícios e mesteres das Caldas das Taipas. Consultando os livros de óbito relativos à freguesia de São Tomé de Caldelas, que se encontram no Arquivo Municipal Alfredo Pimenta, extraímos do anonimato três carpinteiros naturais de São Tomé de Caldelas, falecidos nas seguintes freguesias: São Cipriano de Senharei (concelho de Arcos de Valdevez); Arcozelo (concelho de Ponte de Lima) e na Guarda.

Vejamos em pormenor, por ordem cronológica, estes três falecimentos, ocorridos entre 1712-1724, que atestam a mobilidade dos carpinteiros taipenses no norte e centro de Portugal.

No primeiro exemplo, trata-se de Gonçalo Lopes, que na altura da sua morte “andava travalhando pello seu oficio de carpinteiro” na freguesia de Senharei, termo de Arcos de Valdevez, então comarca de Valença. Este carpinteiro natural de Caldas das Taipas, morreu a 2 de maio de 1712, na freguesia de São Cipriano de Senharei, concelho de Arcos de Valdevez, sendo sepultado na igreja da referida freguesia. Gonçalo Lopes era solteiro, filho de Jerónima Gonçalves, viúva, moradora no lugar das Caldas, da freguesia de São Tomé de Caldelas.  Neste assento de óbito redigido pelo Padre Gabriel de Matos, pároco de Caldelas, sabemos que este carpinteiro, na altura da sua morte “andava travalhando pello seu oficio de carpinteiro” na freguesia de Senharei. Jerónima Gonçalves apresentou ao pároco de São Tomé de Caldelas, uma carta redigida pelo cunho do Reverendo António Lopes de Almeida, abade da igreja de Senharei. Nesta missiva era explicitado, de que o defunto tinha feito testamento de palavra, no qual deixava a sua mãe por herdeira. Neste testamento verbal, Gonçalo Lopes rogava à sua mãe, de que esta mandasse despender na Igreja Paroquial de Caldelas (atual “Igreja Velha”) por sua alma dezassete mil reis de sufrágios de missas “e que deles se pagariam todos os uzos, e costumes desta igreja e ofertas e reza annual”. Na realidade, cumprindo as últimas disposições testamentárias do seu filho, Jerónima Gonçalves mandou celebrar duas missas, respetivamente com dez e nove padres. Ao longo do tempo, Jerónima Gonçalves mandou realizar mais ofícios, que foram devidamente assinalados pelo padre desta freguesia, à margem do assento de óbito. Através do assento de batismo, temos mais pormenores sobre a biografia deste carpinteiro. Filho legítimo de Domingos Lopes e de Jerónima Gonçalves moradores no lugar das Caldas, de São Tomé de Caldelas, foi batizado a 30 de janeiro de 1684, na igreja paroquial da referida freguesia, pelo cura Manuel da Cunha Gusmão. Foi seu padrinho Gonçalo, solteiro, filho de António Álvares e de Guiomar Gonçalves moradores na Taipa de Cima; e madrinha Antónia, solteira, filha de Francisco Jorge e de Maria Gonçalves moradores no lugar do Canto. Através deste documento, inferimos que Gonçalo Lopes terá falecido em Senharei com 27 anos.

Prosseguindo, a consulta dos livros de óbito, reencontrámos outro carpinteiro taipense que faleceu noutra povoação do Alto Minho. Referimo-nos, a Francisco da Costa, solteiro, oficial de carpinteiro, filho de António Francisco, já defunto e de sua mulher Maria Gonçalves, do lugar do Pinhel, da freguesia de São Tomé de Caldelas. Segundo o registo de óbito redigido pelo Padre Gabriel Matos, sabemos de que este recebera no dia 24 de março de 1715, uma certidão do Reverendo Padre Manuel Francisco, abade da Igreja de Arcozelo, arrabalde de Ponte de Lima, na qual era noticiado que falecera Francisco da Costa “de hum dezastre”. Pela certidão do Reverendo Padre da freguesia de Arcozelo, é dito que o carpinteiro taipense fora sepultado na Igreja de Arcozelo, fazendo-se um ofício de dez padre, e outro de cinco padres. É referido no assento de óbito de que o defunto “tem dinheiros adqueridos pello seu oficio”, ficando a sua mãe sua herdeira, “por quanto nam fe testamento”. Após a notícia do falecimento de Francisco da Costa, a sua mãe mandou fazer na Igreja paroquial de São Tomé de Caldelas, três ofícios

Continuando o nosso percurso nos registos paroquiais da freguesia de São Tomé de Caldelas, deparamo-nos com a referência a outro carpinteiro taipense que “andava travalhando pello seu oficio” na então vila da Guarda. Referimo-nos a Custódio da Silva, carpinteiro, morador no lugar da Lameira, de São Tomé de Caldelas, casado com Mariana de Freitas, falecido em 1724. Segundo o registo de óbito, redigido pelo Padre Gabriel de Matos, pároco de Caldelas, a 15 de novembro de 1724, chegara “noticia serta” a esta freguesia, que a 18 de outubro desse mesmo ano, Custódio da Silva, carpinteiro, “falecera da vida prezente”, sendo então sepultado na Guarda. Um mês após o seu falecimento, a 21 de novembro, a viúva fez “seu sahimento” nas Taipas, mas sem corpo presente. Nesse mesmo dia, mandou fazer um ofício de cinco padres, pagando a respetiva oferta. Mais tarde, Mariana Freitas determinou que se celebrasse o segundo ofício com cinco padres.

Estes registos de óbito de carpinteiros taipenses, constituem uma importante fonte documental, não apenas para o aprofundamento do estudo destes carpinteiros sepultados respetivamente em Senharei, na Guarda e em Arcozelo, tanto em termos pessoais, como profissionais, mas também para podermos retirar alguns elementos para o estudo da migração da população taipense no primeiro quartel do século XVIII. Simultaneamente permite-nos redescobrir que estes artistas taipenses exerceram a sua atividade no norte e centro de Portugal, para onde foram chamados para dar corpo a empreitadas de maior ou menor envergadura. Estas obras executadas em Arcos de Valdevez, na Guarda e em Ponte de Lima, permitiram certamente aos carpinteiros taipenses um contato com a obra artística de outros mestres e oficiais.