Um rosto de esperança
Ninguém se salva sozinho. Corria o ano de 2020. Uma pandemia visível dilacerava silenciosamente, mas de forma implacável, os caminhos deste mundo. O perigo era real e a instabilidade era universal. Ninguém, independentemente do seu estatuto, era imune a um fantasma tão, mas tão presentes nas nossas vidas.
Um homem vestido de branco subia lentamente a vazia Praça de São Pedro. Lembro-me como se fosse hoje. Foi um momento de uma grande carga emocional, um momento poderoso. Esse homem era o Papa Francisco, que tendo no seu coração todas as dores individuais e coletivas da humanidade, pedia, de forma genuína e simples, o fim de um flagelo. E foi nesta genuinidade que disse ao mundo que ninguém se salva sozinho.
Que lição extraordinária – a de um homem que, na sua simplicidade, nos convida a uma lógica de fraternidade universal. Extraordinária porque continua a fazer sentido nos dias de hoje. Num mundo em constante transformação, onde imperam o egoísmo e o individualismo; num mundo onde “vale tudo” para nos fazermos ver, onde não se olham a meios para se atingirem os fins; num mundo onde se discrimina facilmente, onde se espalha ódio gratuito; num mundo onde parece ser condição necessária para existência, a afirmação individual que não olha ao outro, a voz de Francisco ecoa: ninguém se salva sozinho.
Importa recordar uma passagem que escreve na sua encíclica Fratelli Tutti, sobre a Fraternidade e a Amizade Social:
Contudo, rapidamente esquecemos as lições da história, «mestra da história». (…) No fim, oxalá já não existam «os outros», mas apenas um «nós». Oxalá (…) tenhamos dado um salto para uma nova forma de viver e descubramos, enfim, que precisamos e somos devedores uns dos outros. (p. 26)
A Humanidade ainda não deu este salto e, com muita infelicidade, parece querer regredir em tanto que se conseguiu coletivamente. Mas Francisco desbravou caminho. Apelou ao amor universal, à dignidade de todos, independentemente da sua condição; apelou a uma Igreja mais aberta, a um mundo mais justo e solidário.
E acima de tudo, conseguiu, no seu papado, falar para crentes e não crentes. Francisco não foi durante estes anos todos um mero líder da Igreja Católica. Foi um homem que, na sua simplicidade, falou para todos, todos, todos, recordando que todos, sem exceção, somos corresponsáveis nesta construção diária de um mundo que priorize o bem-comum. “Não há tempo a perder. E também não há alternativas. Ou construímos o futuro juntos ou não haverá futuro” (Papa Francisco, in A Esperança nunca desilude, p. 146).
Por isso, neste momento de fragilidade na sua vida, apenas me ocorre repetir o que uma professora minha escreveu e eu partilhei: “Oramos por ti, querido Papa Francisco, neste caminho doloroso que percorres. A Igreja precisa de ti, o mundo precisa de ti”.
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