Os Operários dos Curtumes, a decadência da sua indústria vs Cutelaria
Decorreu no 2º sábado deste mês o V Encontro Internacional do Património Industrial e sua Museologia, com sessões no Salão Nobre e na Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento da cidade de Guimarães
Este encontro contou com várias Apresentações, uma das quais minha, tendo por base um trabalho de investigação de cariz industrial que realizei ao redor de mais um arquivo abandonado, que me fora entregue no pico da pandemia do ano passado pelo dono duma casa do Campo da Feira, onde se encontrava o espólio documental do já extinto Sindicato Nacional (Corporativo) dos Operários da Indústria dos Curtumes do Distrito de Braga com sede em Guimarães, tratando assuntos de dez anos, desde a fundação em 1935 até ao ano de 1944
Pena fora que a maioria do demais acervo daquele sindicato tenha sido perdido a favor duma lixeira, o que salvei numa fase mais tardia, foi o pouco que ainda restava duma arrecadação escondida e desconhecida do dono do prédio, que sabendo do meu interesse mo cedeu, salvando-se por um triz.
Comecei por dizer da acuidade do trabalho, agora que a Câmara Municipal pretende junto da Unesco classificar toda a sua vasta Zona de Couros como Património Cultural da Humanidade, lembrando que na reunião de camara que se iria realizar na 2ª feira seguinte se discutiria o seu Plano de Gestão 2021-2026 para o qual eu mesmo concorrera com as minhas opiniões quando esteve em Consulta Pública.
Na Apresentação pública expliquei e de tudo mostrei provas, designadamente:
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O trabalho com o transporte, armazenamento, desempoeiramento, limpeza, reclassificação e arquivo, e revelando o método e a forma do tratamento dos dados documentais.
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O espólio composto de vários pacotes contendo folhas, cartões e alguns livros embalados em papel de embrulho e atados com fio do norte, uma bandeia e à parte quadros com documentos importantes, como horários de funcionamento, menções honrosas, e alvarás desde logo a magnífica Carta Régia de D. Carlos, conferindo os estatutos da Associação de Classe dos Operários de Curtidores e Surradores de Guimarães passado em 21/02/1901, órgão que geriu durante a Monarquia, por toda a 1ª República e pelo princípio do Estado Novo o interesse dos operários até à criação do indicado Sindicato que teve o seu alvará em 20/07/1935 passado pelo Sub- Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social
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Os caixilhos com imagens das pessoas ilustres, como de João Franco, Comendador Manuel José Teixeira, António Pereira de Sousa, Eduardo Manuel d´Almeida, José Pinto Pereira d’Abreu, Bernardino Jordão, Conde de Margaride, Armando Teixeira de Carvalho, além das do Chede de Estado e do Governo, algumas das quais em zinco e em alto-relevo, tudo gente ligada à Monarquia e ao Estado Novo.
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Alguns desses documentos do Sindicato dos Curtumes, para homenagear os Heróicos Operários que com o trabalho muito mal pago, desta muito dura actividade fabril, como dizia de manhã senhora vice-presidente municipal, Adelina Paula Pinto na abertura do Encontro, da insalubríssima indústria, onde ao longo de todos os tempos apenas trabalharam homens, não havendo registo duma única mulher operária.
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Como viviam com suas numerosas famílias em casas muito pequenas, essencialmente ao redor das fábricas, por isso nas freguesias da própria cidade, São Paio, São Sebastião e Oliveira do Castelo, com o quadros construídos, reveladores da residência de cada um dos 394 operários sindicalizados, bem como o recenseamento por idades e por profissões.
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Que o Sindicato nascera no âmbito do Estado Corporativo engendrado pelo Dr. António de Oliveira Salazar que fora eleito para o parlamento pelo extinto Círculo Eleitoral de Guimarães e teve no seu amigo Dr. João Antunes Guimarães, por sinal daqui de Caldas das Taipas, seu indefectível amigo, ministro e eminente Parlamentar, um dos mais influentes doutrinadores do Estado.
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Que consistia em aumentar o Rendimento do Trabalho de forma a garantir o pão da sua mesa e o futuro dos lares familiares. Aos patrões é pedido que produzam o máximo, e que não o distribuam na forma de salário. Para os patrões o tempo e de acumulação de capital e de formação de lucros.
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Que os Dirigentes Sindicais declaram-se em perfeita sintonia com o Governo.
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São os Patrões que quando o Sindicato precisa de dinheiro, lhes emprestam. São os Patrões que pagam as contas maiores do Sindicato.
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Sem Assistência Médica, o Médico do Sindicato só chega em 1941. O direito a alguns medicamentos, os que dão mais robustez ao operário só chega em 1947.
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Não há Contrato de Trabalho, não há Convenção de Trabalho, nem Acordo de Sector.
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O Sindicato em 1940 não sabia que tinha sido criado um Salário Mínimo, que era de 15 Escudos por dia. Mas a pedido duma empresa o próprio Sindicato de Guimarães repudia-o.
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Não fora criada até lá nenhuma Mútua de Socorros e a Caixa Sindical de Previdência só chega em 1944 para a distribuição do Abono de Família. Os Operários estavam entregues à sua sorte e à sua providência.
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.Acta da Constituição da Comissão Organizadora e já com o Sindicato Efectivo dalgumas das suas actas seguintes.
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Mapa e Fichas dos Primeiros Dirigentes Corporativos com fotografia de cada um.
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Contas de Gerência do ano de 1938: 2.355$90 e do ano de 1939: 2.672$45.
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Registo de Sócios do Sindicato, lembrando que a sindicalização era obrigatória no princípio até mesmo para os menores de 18 anos, sendo que a partir do ano de 1939 apenas para os maiores de 18 anos.
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Ganhavam entre 5 e 18 Escudos por dia. Trabalhavam 26 dias por mês. Por isso ganhavam entre 130 Escudos e 312$00 por Mês. Como ganhavam à semana, pagavam também as cotas semanalmente 50 Centavos por Semana que dá 2 Escudos por Mês, na conjugação Cotas/Salários dá de pagamento 1% da féria auferida. Para se perceber ao tempo de hoje, quem ganhava mais, os 312$00, corresponderia agora a 1,55 Euros por mês
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Documentos probatórios da ligação do Sindicato ao Governo e por isso à Doutrina Social Corporativa do Estado Novo e ao Patronato, às Irmandades e aos Organismos da Igreja Católica.
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Timbres, carimbos e listagens de operários de cada um dos Fabricantes, lembrando que há muitas fábricas onde apenas trabalha o patrão.
A Vice-Presidente municipal, Adelina Paula Pinto na manhã daquele sábado, com a humildade que, neste pormenor a caracteriza, tinha dito acerca da promoção da Zona de Couros a Património Cultural da Humanidade que há muita coisa feita, mas há muita por fazer, motivo pelo qual estou a sensibiliza-la para a falta, que julgo dever remediar-se, a de Homenagear o Operário dos Curtumes, que foi quem tudo produziu e ficou sem nada, enriquecendo o Estado, opinião que está a acatar como boa.
Por fim mapas reveladores da pujança da Industria da Curtimenta e Acabamento de Peles sem Pêlo, por Concelhos que aqui apresento, demonstrando a enorme decadência no concelho de Guimarães, outrora com 35% e agora com apenas 0,57% do todo nacional.
O quanto contribuem ainda hoje as Empesas do Sector para a Balança das Transacções Correntes, do seu saldo muito positivo, e o quanto concorrem para a Economia Nacional. Aqui estão revelados os Dados de Pessoal, do Volume de Negócios, do Capital, dos Rendimentos (Lucros), dos Imposto dos Rendimento das Empresas (o IRC 21%+DERRAMA 1,5%), sem falar na Arrecadação para o Estado dos Impostos sobre o Património que gere todo aquele envolvimento Empresarial e de Pessoas, como o IMT, o IMI, os Impostos sobre as Viaturas (o ISV´s+IUC´s), sobre o Consumo (o IVA), sobre o Rendimento do pessoal empregado (o IRS, do qual 5% dele é directamente para o município).
Documento que pela sua importância enviei para o vereador Ricardo Costa com o pelouro das Finanças e do Desenvolvimento Económico da Câmara Municipal de Guimarães, dando-lhe nota das perdas financeiras e de pessoas em Guimarães derivado da desindustrialização, em tempo que não o da sua administração e a favor doutros concelhos que o fomentam, para o qual prometeu a sua maior atenção.
E, alertando-o para situações idênticas ocorridas, como foi o caso do desaparecimento da indústria de penteeiros que teve a sua última fábrica aqui em Caldas das Taipas, da qual eu salvei todo o seu espólio, aqui além do Documental, todo o seu Parque de Máquinas, Acessórios, e as existências de Matérias-Primas, Subsidiárias e de Consumo, bem como Material em Vias de Fabrico e Produto Acabado.
De modo a precaver o apoio que se impõe à indústria da cutelaria, que, os do meu tempo aos nove anos de idade aprendeu na escola da 4ª classe quando obrigados a decorar pelos mapas de parede que as principais indústrias concelhias, eram em Guimarães, a do Têxteis, Curtumes e Cutelarias, esta última agora com o seu bastião em Caldas das Taipas que se bate contra a concorrência desleal dos produtores asiáticos a merecer políticas de protecção aduaneira daqueles países.
E, a necessitar de mais promoção, afinal é Caldas das Taipas que ostenta o título de capital da Cutelaria e, por isso o legal representante em Junho do próximo ano no III Encontro Mundial das Capitais da Cutelaria a realizar na cidade de Albacete da vizinha Espanha. Para onde já está assegurada a presença da cutelaria de cozinha de Portugal, mas sem título de Capital, pelo apoio do município das Caldas da Rainha, A organização espanhola espera ainda resposta e apoio ao convite que formalizou à Câmara Municipal de Guimarães e à Junta de Freguesia de Caldas das Taipas.
Caldas das Taipas, 31 de Julho de 2021, carlos@carlosmarques.pt