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A inteligência artificial no mundo dos humanos artistas

Pedro Conde
Opinião \ quarta-feira, abril 24, 2024
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Bastariam dois ou três destes artistas modernos, semi-deuses populistas vazios e ocos que inundam Tik Toks e Instagrams, para que a humanidade voluntariamente entregasse a chave do planeta ao bandido.

A Inteligência Artificial é uma realidade cada vez mais presente no nosso dia à dia, e o que há umas décadas nos parecia ficção cientifica, aos poucos vai tornando-se parte do no nosso cotidiano, onde as máquinas começam a tornar-se cada vez mais “Autoaware” do meio que as rodeia e cada dia que passa mais “nossas parceiras” e auxiliares nas tarefas diárias e em tudo o que fazemos. Devo dizer que cada dia que passa sinto mais que o “Doomsday” e a “Skynet” do Exterminador Implacável parece não ser uma realidade assim tão impossível e tão distante.

Ora bem, mas vamos direcionarmos ao tema que nos interessa, a música, e, tal como em muitos outros mercados, a IA está a transformar e revolucionar também este setor. O que começou como uma série de auxílios aos músicos cantores e compositores, está a evoluir de uma forma descontrolada, e poderá em pouco tempo tornar-se (se é que não se tornou já), a ferramenta que vai substituir o Artista, e a “esmola que vem matar o pobre”? Como é claro, muitos dizem que isso é impossível, que as máquinas nunca conseguirão reproduzir os sentimentos humanos, e que a alma humana nunca poderá ser copiada assim como a sua arte. Eu não estou tão certo disso, tenho visto coisas fantásticas acontecer todos os dias (e digo fantásticas nem sempre no sentido positivo), e cada vez estou mais certo que o ser humano é basicamente um animal, e como todos os animais depois de compreendido e entendido, pode ser facilmente controlado, manipulado e adestrado. Adestrado ao ponto de condicionar a sua escala de perceção e valorização do que é arte aliás, condicionado até na sua perceção e valorização do que é Bom ou Mau.

Vou partilhar apenas duas histórias para perceberem melhor o meu ponto de vista.

A primeira, amplamente divulgada, o fenómeno do “Fake Drake”. Resumidamente estamos a falar de uma música, “Heart on my sleave”, que foi lançada no início do ano passado, que supostamente reunia Drake e The Weeknd, e que automaticamente viralizou nas redes sociais, e em apenas um fim de semana obteve centenas de milhares de gostos e partilhas. Passado esse fim de semana simplesmente desapareceu, e foi retirado repentinamente de todas as plataformas digitais. Mais tarde veio a perceber-se que afinal nem o Drake, nem os The Weeknd eram autores deste tema, e que o mesmo tinha sido feito através de Inteligência Artificial que conseguiu emular as vozes e criar um tema que enganou milhões, e em apenas um fim de semana se tornou um hit. A música “Heart  on my sleave” terá sido carregada na conta de Tik Tok de Ghostwriter977 e confundiu totalmente os fãs que automaticamente transformaram o tema num sucesso, contudo pelos vistos terá sido uma máquina a criar este sucesso musical. Ora bem, os humanos adorarem a obra artística da máquina! Claro que a Indústria musical veio automaticamente dizer que todos os artistas estão protegidos por leis que controlam a utilização da IA na composição de temas, e que isto nunca tinha acontecido antes, blá blá blá…. Claro que nunca!!! E nós, como bons carneiros, acreditamos nisso! Not!!! Aliás cada vez mais só vejo artistas com um talento tão claro que não precisam de máquinas nenhumas (alguns nem com máquinas).

Meus amigos enganar a carneirada é muito fácil, não acreditam?? Vamos então à minha segunda história.

Esta um pouco mais antiga, mas que apenas tive conhecimento recentemente. Ora bem, todos sabemos que os hits do Marco Paulo, ou do Tony Carreira são músicas já existentes das quais se compram os direitos de autor a nível nacional, e que depois com uns arranjos e uma letra de um poeta mercenário, são adaptadas, e se tornam sucessos da cultura portuguesa. “Mas isso era no tempo dos nossos pais”, dizem vocês. Bem, deixem-me corrigir-vos, e ao mesmo tempo arruinar a vossa infância/adolescência meus carneirinhos. Todos vocês conhecem por exemplo, a música dos D’zrt, “Para mim tanto me faz”.  Da minha geração, as anteriores e posteriores, toda a gente conhece esta música, e vejo toda a gente a cantar, sim, é verdade, até os gajos do rock, todos abraçados, a lembrar os tempos passados de secundário/faculdade, e acharem, “esta música é tão nossa…” Bem, mas sabem porque é que ela foi um sucesso instantâneo?... Meus amigos, porque simplesmente esse tema é um tema a soldo, com mais de 20 anos, e que já foi editado por dezenas de artistas teenagers, com sucesso equivalente em diversos países, antes de chegar a Portugal e ao “Para mim tanto me faz” dos D’zrt. Podem pesquisar que certamente vão descobrir como eu descobri, o tema cantado em diversas línguas, por diversos miúdos, normalmente ligados a séries televisivas de adolescentes. O tema original tem o nome de “Teenage Superstar” da holandesa Kiam Liam. Devo dizer que, ao menos no tempo do Marco Paulo, ainda se faziam uns arranjos musicais, e havia um certo brio em adaptar minimamente o tema, mas neste caso foi mesmo chapa 7, igual do primeiro ao último acorde, mudando apenas a letra. Fórmulas de sucesso de uma indústria musical capitalista (de uma moralidade duvidosa), replicadas até à exaustam, em nome da arte, mas da arte de fazer dinheiro apenas. Mas tudo isto acontece acima de tudo porque os seres humanos são previsíveis, ainda mais na irreverência da juventude onde são mais permeáveis a influências externas.

Agora pensem comigo, se já eramos seres manobráveis nos tempos dos nossos pais com os sucessos do Marco Paulo (muito antes disso, mas sigam o meu raciocínio para não complicar a equação), imaginem agora com supercomputadores a analisar segundo a segundo os nossos padrões diários, os nossos cliques, os nossos gostos, os nossos movimentos e toda a informação fornecida, através dos nossos telemóveis, smartwatches, que nos medem até batimentos cardíacos em tempo real e cruzam essa informação biométrica dos estímulos físicos, com o que estamos a ver e ouvir? É só fazer as contas. Digo eu que não percebo nada disto. Agora imaginem que a máquina com IA em algum momento se torna “Autoaware”, consciente… Fazer música que o ser humano vai adorar é instantâneo, um algoritmo matemático, uma equação. Aliás se estas máquinas conscientes entendessem conquistar e tomar conta deste mundo de humanos, seriam necessários dois ou três dias, e ao terceiro dia já poderiam certamente descansar, e não precisariam certamente dos exterminadores implacáveis T-1000 nem de armas. Bastariam 2 ou 3 destes artistas modernos, destes novos Semi-Deuses populistas vazios e ocos que inundam os Tik Toks e Instagrams para que a humanidade voluntariamente entregasse a chave do planeta ao bandido. Falo de música, mas podem adaptar este raciocínio a qualquer outro tema, sei lá, por exemplo a política, basta usarem a vossa imaginação!!

 

Como sugestão musical deixo dois temas esquecidos por muitos, uma tal de “Grândola Vila Morena” de um miúdo chamado Zeca Afonso, e a “E depois do Adeus” de outro jovem chamado Paulo de Carvalho… Façam o favor de ouvir com muita atenção, e não tenham dúvidas meus amigos, os Lobos estão à porta, e nós é que os estamos a convidar a entrar… “Aqueles que não conseguem lembrar o passado, estão condenados a repeti-lo”.