Ser democrata não é um estado de alma
No ordenamento administrativo português há dois órgãos para administrar uma freguesia, a Assembleia de Freguesia e a Junta de Freguesia.
Apesar de hoje em dia muitos insistirem que dos dois o mais importante, aquele que concentra os olhares em noite eleitoral, é a Junta de Freguesia, a verdade é que não é bem assim: a assembleia é o órgão mais representativo.
Nessa condição de órgão mais representativo deve merecer respeito do órgão autárquico que fiscaliza e acompanha, mas talvez devido à inversão de valores que está instalada, o facto é que as juntas de freguesia se acham no direito de menosprezar ou mesmo desprezar as deliberações adoptadas pelas assembleias.
Como julgo ser sabido, a Assembleia de Freguesia de Caldelas aprovou uma proposta apresentada pela CDU sobre o negócio da Pensão Vilas. Devido ao facto de a solução mais transparente, o concurso público, estar ferida de morte, entendeu aquela coligação avançar com um concurso limitado a três entidades de reconhecido mérito, instaladas na freguesia e dedicadas à exploração de lares para idosos.
Essa proposta exigia, para ter viabilidade, a rejeição de uma outra, a da venda directa à ADIT, da autoria da Junta de Freguesia, o que foi conseguido.
A venda directa era um fato feito à medida de um único interessado, o que desde logo abonava pouco a favor da transparência da deliberação e, caso tivesse sido aprovada, constituiria um acto de gestão que não dignificaria a Assembleia de Freguesia e beliscaria a honestidade dos eleitos que a votassem favoravelmente, manchando-os a um e outros com fundadas suspeitas de favoritismo e no limite negócio em causa própria, pela evidência de muitos dos votantes serem simultaneamente associados da ADIT.
A deliberação da assembleia já foi comunicada formalmente à junta há algumas semanas, sem que esta se tenha pronunciado e em que sentido, se a aceita e daí retira as devidas consequências ou se a recusa.
O populismo inato do presidente da Junta e de alguns vogais choca com o respeito devido a quem tem por obrigação legal fiscalizar os seus actos de gestão, a assembleia de freguesia.
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Publicado no jornal Reflexo #248, de Fevereiro de 2017
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