Sobre o lugar central da Cultura
Na próxima semana cumprem-se cinco anos sobre a abertura da Capital Europeia da Cultura (CEC) de 2012. Que se saiba, não está prevista nenhuma iniciativa para assinalar a data. Em Outubro, passaram dez anos sobre o anúncio de que Guimarães acolheria essa realização. Não houve qualquer sublinhado público desse momento. E, no entanto, em Dezembro, o dia em que a Unesco classificou o centro histórico da cidade como Património Cultural da Humanidade voltou a ser celebrada com pompa, à semelhança do que vem acontecendo anos após ano. E muito bem.
Outro exemplo. Apercebi-me recentemente de que quando, enquanto jornalista, recebo um e-mail da comunicação da Câmara de Guimarães há um infindável número de logotipos que aparecem na assinatura do mesmo. Lá está a imagem do município, o “selo” da Unesco e o coração que de tornou marca da CEC. Mas também encontro os logos da Cidade Europeia do Desporto (CED), da candidatura a Capital Verde Europeia (CVE) e até da iniciativa Guimarães Marca. Todos ao mesmo nível. Como se tivessem igual importância. Não têm.
A CEC foi o que de mais importante aconteceu em Guimarães em mais de um século e parece que o poder político não percebeu isto. Os dois exemplos anteriores servem apenas para aprofundar uma reflexão que, na verdade, vem de longe. Quando, no final de 2015 e neste mesmo espaço, escrevia que a cultura tinha perdido o papel central na ideia de futuro de Guimarães, referia-me a isto mesmo. Mais de um ano volvido, não tenho nenhum motivo para pensar que estava enganado.
Ao longo do último mandato autárquico, foi reforçado o trabalho bem feito no sector cultural em Guimarães, tanto ao nível da câmara como da cooperativa responsável. Esse é um esforço que vinha de trás, que teve um novo impulso, e que está a dar fruto. Não apenas nas iniciativas mais estabelecidas, como nos movimentos orgânicos que se vão instalando na cidade – e a que só aos mais distraídos poderão passar despercebido. Não está em causa, nesta reflexão, a qualidade dessa aposta nem a sua valia.
O que está em causa, a meu ver, é o seu lugar na política global para o concelho. Que deixou de ser central. O erro começou no anterior mandato quando. Ainda a Capital Cultural não estava terminada e já a cidade anunciava a intenção de ser Cidade do Desporto. E depois Capital Verde e Capital do Voluntariado, ideia entretanto abandonada. O poder político não percebeu que a mais-valia de ser Capital Europeia da Cultura estava precisamente no facto de se ser Capital Europeia da Cultura – a rede a que esse estatuto dava acesso, a capitalização da criação aqui feita e das estruturas que aqui trabalharam –, preferindo apostar numa ideia de “cidade de capitais” ou “cidade de eventos”.
Guimarães não tem dimensão nacional e muito menos europeia para ser uma cidade total, capaz de abarcar todo e qualquer evento, toda e qualquer aposta. O caminho para cidades pequenas e médias é a especialização. Perceber onde é que é diferente das demais e tornar esse aspecto central em toda a sua política pública. Em Guimarães, não podia ser outra a aposta que não a Cultura. Por causa da importância histórica da CEC, por causa do seu sucesso e pelo facto de não haver, à escala global, nenhuma outra cidade desta dimensão com a mesma vitalidade cultural e artística. Esse é, nos dias que correm, o nosso bem mais precioso.