Santa Casa da Misericórdia de Guimarães
Tenho respeito e consideração pelas instituições em geral e por algumas em especial.
É o caso da Santa Casa da Misericórdia de Guimarães.
De que não sou associado (“irmão”, na terminologia eclesiástica), embora já tivesse pensado em o ser, para contribuir para o seu trabalho solidário, que valorizo.
Falo, por consequência, como cidadão livre.
Considero as misericórdias marcos civilizacionais na caminhada histórica da Humanidade, baluartes nas respostas encontradas para porto de abrigo dos menos afortunados quando o peso da idade reclama conforto, carinho, atenção, cuidados.
Por isso me custa ver na lama, objecto de barrelas e de verrina, instituições nobres, dignas, como está a acontecer com a Santa Casa da Misericórdia de Guimarães.
Estou, por princípio, solidário com os trabalhadores e sei, de saber acumulado, que terão muitas razões de queixa para vencerem temores, vergonhas e críticas tornando público o seu descontentamento.
As greves, que levaram a efeito, tem custos para os grevistas, custos que estão para lá da perda de salários e se estendem pela incompreensão de familiares e amigos dos utentes.
Quando se decidem por esta forma suprema de luta, os trabalhadores já não aguentam mais – a perda da remuneração pesa menos que a desconsideração de que são objecto.
Quero acreditar que a administração não está a saber lidar com o conflito.
Em vez de ouvir as queixas, ameaçou.
O resultado foi mais trabalhadores em greve. Reagindo como o mais selvagem dos patrões, os administradores (“mesários” na linguagem do compromisso/estatutos) suspenderam associados, anunciaram processos disciplinares a esmo que depois não concretizaram e até desmentiram, ateando labaredas de uma fogueira onde arde o bom nome da instituição e cresce o descontentamento.
Obviamente, nestas circunstâncias os visados procuram defender-se com os meios ao seu dispor.
A seu pedido reuniram com a CDU a quem expuseram os seus pontos de vista. Não sei se vão reunir com outros partidos e entidades, mas é natural que o façam.
Mariana Silva, deputada na Assembleia da República e candidata a presidente da Câmara de Guimarães ouviu e tomou nota do que ouviu, sendo expectável que vai questionar o Governo sobre o caso que, como se percebe, tende a ganhar outra dimensão pública.
A administração da Misericórdia não está a lidar com o caso com os cuidados devidos.
A tentativa de colar a ele actos relacionados com o serviço prestado aos utentes parece-me uma tentativa desesperada de desviar a questão laboral para áreas sensíveis, o que reprovo.
Nas páginas de uma rede social, um administrador expôs um utente à curiosidade mórbida, incorrendo em falta que reputo de grave, mais a mais tratando-se de alguém incapacitado de se defender por meio próprios.
Eu li essa posta estúpida.
É verdade que o autor depressa apagou o que publicou, mas o erro estava cometido, foi visto e criticado e constitui um precedente perigoso que espero não seja replicado.
A partir daqui o conflito parece ter-se agudizado.
Vieram a público acusações e mais acusações, umas mais graves do que outras, nas várias valências, com processos disciplinares e expulsões de “irmãos, expressão de um mal-estar que aprofunda o fosso que separa as partes, dificultando o necessário diálogo e entendimento.
Se em causa estiver a solvabilidade da Misericórdia, o que admito, que se diga sem meias palavras para encobrir terceiros, mas que esse argumento não seja usado contra quem trabalha e dá o melhor de si para que os utentes se sintam bem e a instituição goze do respeito da comunidade.
Dialoguem, se o diálogo ainda for possível.
[ndr] Artigo de opinião originalmente publicado na edição de julho do jornal Reflexo.