Lugares que Nunca Partem
Um dia esta foi a nossa casa...
Aquela em que fosse o que acontecesse nós regressávamos. Uma casa cheia de amor, carinho, mimo, bom coração.
Voltar à casa dos meus avós, é como entrar num livro, onde todas as páginas foram lidas mil e uma vezes, mas agora parecem escritas por outra mão. O portão vermelho que antes rangia num som familiar, e, às vezes era mesmo necessário a ajuda de uma faca para ser aberta, anunciava sempre a chegada de algum de nós. Agora, ele permanece, mas o livro é outro, as páginas ainda nem sequer foram escritas, e quem sabe se um dia este portão não será substituído por um modelo mais moderno, onde poderão ser escritas novas histórias, novas memórias.
Olhar todo aquele espaço exterior, que permanece intacto, mantendo as lembranças mais doces de todas as vezes que estive ali. Um dos verdadeiros encantos de todo aquele espaço, estava no quintal, onde se “escondiam” alguns tesouros naturais. Era naquele lugar que várias árvores de frutos se erguiam carregadas de sabores que até hoje consigo sentir na memória. Dióspiros, pêssegos, ameixas, peras, maçãs, clementinas, tangerinas, laranjas, figos... e, claro, as uvas americanas, tão doces e suculentas, que pareciam feitas de sol. Cada fruta tinha a sua época, e com elas vinham todo um trabalho para colher o mais maduro, provar o mais doce, ou até mesmo subir no escadote de madeira, feito pelo meu avô, que tantos anos durou, conseguindo assim alcançar os frutos mais difíceis.
Este espaço não era apenas um quintal, era um pequeno universo, onde cada árvore, cada fruto, e até o tanque contavam histórias de simplicidade e abundância.
Ainda guardo memórias do carro dos meus avós. Um vauxhall azul muito especial. Era a minha avó que o segurava ao volante com toda a firmeza de quem conhecia todos os caminhos. Aquele belo carro era um símbolo de liberdade, conduzido por alguém que além de guiar o carro pelas estradas, sabia guiar as nossas vidas.
Neste momento, os meus olhos voltam-se para a casa em si, ou melhor, para o que resta dela. As paredes exteriores, feitas de pedra antiga, ainda resistem ao tempo, como se carregassem em si a teimosia de quem não quer ser esquecido. Já não existe telhado, janelas ou portas, algo que um dia a tornou acolhedora, mas restam estas pedras como testemunhas silenciosas de uma vida que aqui se impulsionou.
Quem sabe, um dia, não se erguerá aqui uma nova casa? Talvez, construída a partir destas mesmas pedras, carregadas de memórias. Bons foram os momentos que nunca irei esquecer.
Uma casa com raízes na história, mas aberta aos sonhos do futuro.