Equívocos autárquicos
“Pareces adivinho”, dizia para comigo enquanto lia as notícias sobre as listas que o PS apresenta às próximas eleições autárquicas. Entre as seis pessoas incluídas em lugares potencialmente elegíveis não se vislumbra um nome óbvio para assumir a pasta da Cultura.
Escrevia na minha última crónica que a Cultura reclama uma posição de centralidade nas opções políticas. Ora, se o partido do poder se prepara para, em caso de vitória, deixar de ter um vereador da Cultura, está precisamente a contrariar esta necessidade. Desde logo do ponto de vista simbólico. E isso, em política, conta muito.
É certo que o modelo Educação+Cultura, que parece estar a desenhar-se para os próximos quatro anos em caso de vitória socialista, já foi usado anteriormente e é comum em outras cidades. Acontece que Guimarães, em 2017, não é uma outra qualquer cidade. Não é sequer a Guimarães de 1997 ou de 2007. É uma cidade que foi Capital Europeia da Cultura e que tem uma responsabilidade para com os seus cidadãos e os parceiros europeus de dar ao sector a importância que ele merece e justifica.
A decisão incompreensível do PS contrasta com o que fazem, por um lado, a Coligação Juntos por Guimarães, que apresenta na sua lista um nome evidente para a Cultura – Ricardo Araújo, que presidiu a uma das principais associações culturais concelhias – e, por outro, a CDU tem feito da Cultura uma das suas linhas de força na pré-campanha, balançada pelo passado associativo de Torcato Ribeiro e pela “bandeira” da sua actuação no processo de resgate da Torre da Alfândega.
À ausência de um nome para a Cultura, o PS junta a escolha de Sofia Ferreira para a sua lista. Com um passado de 20 anos de trabalho em organismos públicos sempre na área do Turismo, isto parece significar que, em caso de vitória do PS, teremos uma vereadora do Turismo, mas não teremos vereador da Cultura. É mais um sinal. E bastante elucidativo de uma visão da cidade relativamente à qual não podia estar mais radicalmente em desacordo.
O principal problema na lista do PS é, porém, a escolha de Seara de Sá para um lugar elegível. Não é aceitável que alguém a quem foram pagos 19.750 euros+IVA há menos de um mês para elaborar um estudo apresentado como “técnico” – mas que tem uma forte carga política, dada a sensibilidade do tema do estacionamento – possa agora ser vereador. Para executar um plano que foi pago para desenhar. Não faz sentido.
Face a esta história, Seara de Sá não tem condições políticas para ser vereador em circunstância alguma. Se vivêssemos numa sociedade exigente, o arquitecto não teria sequer condições para se manter na lista do PS no momento em que ela seja entregue no Tribunal.
Curiosamente, desde que a inclusão de Seara de Sá na lista do PS se tornou pública, não ouvi nem li um único comentário dos responsáveis da coligação Juntos por Guimarães sobre um assunto com estes contornos escandalosos. As semelhanças com a situação de Monteiro de Castro, número dois das suas listas e autor, por exemplo, do projecto de engenharia do parque da Caldeiroa (que PSD e CDS criticam em público), talvez ajudem a perceber este silêncio.
A principal nota que me merece a lista da coligação prende-se, porém, com a ausência de novidades. A lista é, em boa medida, a mesma de há quatro anos. A incapacidade de trazer para lugares de destaque alguém que não seja militante do PSD e do CDS é o contrário de um projecto que se apresenta como mobilizador e para lá dos limites partidários. E esse é um mau prenúncio para quem quer romper com o domínio socialista.