Tratamento inovador para as cartilagens está a ser desenvolvido no Avepark
A operação consistirá na injeção de um gel, que permitirá que as cirurgias passem a ser feitas em ambulatório.
É no último piso de um dos edifícios existentes no Avepark que está instalado um dos mais avançados laboratórios existentes em Portugal. Trata-se de um complexo onde estão três salas completamente isoladas, que permitem efetuar um conjunto de procedimentos que não são possíveis nas salas laboratoriais convencionais. A entrada nestas "salas limpas" é altamente controlada e restrita. Há duas antecâmaras que é preciso atravessar antes de entrar.
É nestas mesmas instalações que está a ser desenvolvido um novo tratamento para desgaste das cartilagens humanas.
É fora das salas limpas, mas ainda assim num ambiente suficientemente assético, característico dos ambientes dos laboratórios, que Rui Sousa, CEO da Stemmatters, nos recebe.
Apesar de esta empresa se dedicar a outros serviços, o investimento em investigação e desenvolvimento tem sido uma aposta, cuja capacidade vem sendo reforçada pelo aparecimento de novos investidores.
O Gelmetix é o resultado de um desses processos de investigação e que foi primariamente desenvolvido numa daquelas salas limpas que começamos por descrever.
David Learmonth, coordenador do Departamento de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Stemmatters foi quem descobriu a molécula que incorpora o gel e que está agora numa fase avançada de testes. Esta descoberta é uma versão de vários estádios anteriores por que passou todo o processo. Learmonth explica-nos que não houve propriamente um momento Eureka porque, explica, há ainda um caminho longo a percorrer e prefere não deitar foguetes antes do tempo.
As cartilagens são um tecido que existe, principalmente, junto das articulações do corpo. São como que um protetor que impedem o efeito abrasivo dos ossos quando estão em contacto. São por isso partes de elevado desgaste principalmente nos joelhos, situações que se agravam quando decorrem de atividade física. Há uma estimativa que indica que 60% dos pacientes com dores nas articulações têm lesões agudas nas cartilagens. Apesar de ser fundamental para o funcionamento correto do corpo humano, as cartilagens têm uma reduzida capacidade de regeneração, isto é, de se curarem por si.
O processo que está a ser testado pela Stemmaters explica-se de forma mais ou menos simples, embora estejamos a descrever um processo extremamente complicado. Este tratamento imita em laboratório os processos naturais, que facilitam a aderência do gel ao osso e que evitam a necessidade de saturação do paciente.
Comparativamente ao procedimento que é adotado atualmente, trata-se de um tratamento que minimiza a invasão no corpo humano. Basicamente, a cirurgia, que obriga à abertura de toda a zona da lesão, é substituída por um ou dois orifícios, por onde deverá ser aplicado o gel na base do osso. De acordo com o investigador David Learmonth, este processo deverá diminuir o custo da operação em 37%. O tratamento que está a ser testado é portanto minimamente invasivo e permitirá que os pacientes façam a cirurgia em ambulatório.
Estima-se que em 2023 haja 1,5 milhões de artroscopias, para tratar lesões que são cada vez mais frequentes e em indivíduos cada vez mais novos. Metade desses tratamentos serão ao joelho.
Mas então, quando poderemos passar a ter disponível este novo tratamento? O horizonte neste momento é 2023, altura em que os responsáveis da Stemmatters esperam ter o processo em comercialização. Será a fase crucial, de materialização para a sociedade, após um longo e dispendioso processo de desenvolvimento e de investigação, desde que num momento chave a molécula foi descoberta, em 2016.
Projeto entrará a seguir na fase de testes em seres humanos. Até agora, o tratamento foi testado em animais de laboratório e foi feito trabalho de prototipagem do dispositivo médico que deverá aplicar o material no paciente - uma espécie de pistola futurista, que é capaz de efetuar praticamente toda a intervenção junto da cartilagem danificada. Trata-se de um dispositivo médico de classe 3 - o mais exigente do ponto de vista da sua regulamentação técnica e médica.
Uma das dificuldades da Stemmatters é estar localizada fora do que Rui Sousa considera ser um ecossistema científico de ponta. Por exemplo, não existem laboratórios capazes de efetuar testes com certificação GLP. Esta prática de certificação também não é corrente em Portugal, uma vez que não há no país ensaios certificados como GLP. Mas, acrescenta, não é por estar localizada no Avepark. Esta seria uma dificuldade em qualquer parte de Portugal, conclui.