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NAT. "O que me deixa mais triste é não ver a malta a correr"

Pedro C. Esteves
Desporto \ terça-feira, abril 20, 2021
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As habituais corridas matinais de domingo não saem à rua e é provável que a Corrida de Atletismo de Caldas das Taipas não se realize Pandemia "abanou" o Núcleo de Atletismo das Taipas

Manuel Mota tem saudades dos tempos em que, ao domingo, juntava os amigos para palmilhar, a ritmo de corrida, as ruas da vila e redondezas. Mais do que manter a condição física, os atletas do Núcleo de Atletismo das Taipas (NAT) conviviam. O contexto mudou e o dirigente explica que o cenário atual é inquietante – há associados que não vê há mais de um ano.

“Não estivemos parados só um mês, foi muito tempo, estamos há mais de um ano sem fazer os treinos em conjunto”, recorda o dirigente. “Nos domingos tínhamos 20 atletas a correr, era o convívio desta associação que nos mantinha de pé”. A pandemia não afastou só os sócios das ruas, a convivência foi-se perdendo. “Foi tudo por água abaixo, e tudo isso vai contribuir para que esta associação vá abanar um bocadinho”, resume. E o abanão será forte? Manuel Mota pensa que sim: “Estou com um bocado de receio. As pessoas separaram-se muito, correm à volta das suas casas, nos recintos mais perto, e vão-se habituando. Isto ainda está para durar. Há atletas que eu não vejo há um ano. E isso complica, preocupa. A associação fortalece-se com as pessoas perto dela”.

Trazer gente para o mundo da corrida

Numa entrevista ao Reflexo, na agora deserta sede do núcleo, no parque de lazer de Caldas das Taipas, Manuel Mota anseia por ver novamente as gentes do NAT descer a Alameda de Rosas Guimarães para dar início a mais uma corrida. “O que me deixa mais triste é não ver a malta a correr. Todos os dias, mesmo que não viesse treinar, falava com um, falava com outro, agora não, vamos para casa”.

O sentimento é partilhado por Pedro Regueiras. Entrou para o NAT em 2005. Para o atleta, a associação é mais do que corrida. “O que nos movia também era chegar ao fim-de-semana e irmos 20 ou 30 pessoas treinar. Por vezes, vínhamos aqui para a sede, convivíamos sexta-feira à noite, ao sábado. No final do dia vimos do trabalho, chegamos aqui, temos um grupo de amigos, treinamos, contamos o que correu mal no dia, o que correu bem, tomávamos um banho e sentíamos prontos para novo dia”, sintetiza.

O atleta lembra também o carácter lúdico do NAT, que, para além de ser parte importante no “resgate” do parque – “os lampiões estavam fundidos, havia delinquência” – vem sendo um importante motor para o fomento da prática do exercício físico na vila. É que, quase como uma bola de neve, as pessoas vão-se mobilizando (mesmo que não entrem para o núcleo). “Nós temos, neste momento, 150 sócios. Estes mobilizam o triplo: sejam mulheres, filhos, ou tios. Na minha casa, só eu sou daqui do NAT, mas todos fazem exercício físico pelo exemplo”.

Agora, preocupação de Pedro incide nas gerações mais novas. Com as associações desportivas da região paradas, teme que se tenha perdido “a dinâmica desportiva” característica desta zona do concelho. “A gente vinha aqui, treinava e víamos carrinhas do CART, Sandineneses, do Caçadores. Eram centenas de crianças que faziam exercício físico diariamente. E hoje em dia não fazem. Ou fazem muito pouco. E isso só se vai notar daqui a dez anos. Fazer em casa não é igual”.

Uma prova especial

“O que a gente quer”, resume Pedro Regueiras, “é fazer os convívios, realizar novamente a nossa corrida”. Algo que, ao que tudo indica, não vai ser possível. A Corrida Caldas das Taipas deve não sair à rua. “O NAT era conhecido pelo evento que fazia, é um dos maiores eventos da vila. Deixa-nos tristes, não vemos as pessoas a nossa volta, a vila enchia-se de pessoas”, explica Manuel Mota.

Para o dirigente, é “um problema grande”. “Uma corrida destas, em que participavam umas 400 pessoas, e agora deixá-la cair dois anos, para a levantar vai ser um problema. Isto alimentava--nos um bocadinho. Não era só a parte financeira, dava-nos uma alavanca muito boa”.

O golpe foi duro. Ainda para mais, o NAT não é clube profissional e o panorama pós-covid não é animador. “As associações amadoras vivem daquilo que é dado, do ir bater à porta das empresas, e as empresas estão como estão”. “Ainda bem que o NAT não criou despesas”, ressalva. No entender de Manuel Mota, quando tudo “estabilizar”, “vai ter que se começar do zero”. “A parte financeira será mais difícil”.

Antes do recomeço, Manuel Mota vai contactando os sócios. Do outro lado da linha, sente alguma melancolia. A sede — ou o parque, terreno em que o NAT se sente em casa — era sempre uma porta aberta para quem precisasse de um “empurrão” para começar a correr e a iniciar a prática de exercício.

“As pessoas desciam a vila aqui para baixo, muitas delas vinham e ficavam com o NAT aqui. Há muita gente que hoje corre e caminha porque encontrou alguém do NAT. Agora não estamos aqui”.