Miguel Matos treina guarda-redes na China
Como atleta, representou o CC Taipas durante 10 anos e esteve ainda em clubes como o Vitória SC, Trofense, Vizela; Sandinenses, Ermesinde e Amares. Já como treinador, também representou o CC Taipas em diferentes escalões de formação e mesmo nos seniores, tendo ainda passado por Merelinense, Serzedelo, Aves, Santa Clara e pelas Seleções da Associação de Futebol de Braga.
A sua primeira experiência no estrangeiro começou em Omã, há três anos, como treinador dos guarda-redes do Al Nahda CF, da Liga Profissional daquele país da Península Arábica, que faz fronteira com a Arábia Saudita e com os Emirados Árabes Unidos.
No ano transato, rumou à China, para trabalhar com os guarda-redes dos escalões de formação da Hubei Football Association, na Província de Hubei que tem 60 milhões de habitantes, no centro da República Popular da China. Neste momento, encontra-se no Hubei Chufengheli CF que milita na 2ª Liga chinesa.
Como surgiu a oportunidade de sair do país?
A oportunidade de sair de Portugal surgiu através do convite do Bruno Pereira, treinador português que treinava no Al Nahda, de Omã. Depois de uma época de sucesso no Aves onde subimos à 1ª divisão, a direção desportiva do clube mudou e decidiram mudar a equipa técnica. Convidaram-me a prolongar o contrato mas não na equipa profissional, surgindo a hipótese de ir para Mirandela acompanhar os jogadores emprestados pelo Aves, funcionando o Mirandela como clube satélite. Estive em Mirandela dois meses e depois surgiu o convite da parte do Bruno e decidi que seria a altura de sair da minha zona de conforto e sair de Portugal.
A primeira experiência, felizmente, correu muito bem. Encontramos o clube na 9ª posição, numa situação complicada mas, conseguimos terminar o principal campeonato de Omã no 3º lugar, alcançando também a final da Taça da Liga .
Como foi viver em Omã?
É um país simpático que faz fronteira com os Emirados Árabes Unidos. A cidade onde vivi fica localizada no meio do deserto, que tinha como único ponto positivo a curta distância do Dubai (100km), o nosso destino preferido nas folgas. Trabalhar no Médio Oriente tem as suas particularidades. A religião está acima de tudo, os treinos eram no final do dia por causa das temperaturas elevadas e também tendo sempre em conta as horas das orações. Na altura do Ramadão, chegamos a jogar às 22 horas para que os jogadores se alimentassem convenientemente antes do jogo. O aquecimento em dias de jogo, por vezes, tinha de terminar antes 30 minutos do jogo iniciar para que os jogadores pudessem rezar. Foi um ano praticamente sem beber álcool e sem comer carne de porco. Na época seguinte continuamos no mesmo clube, mas começaram a surgir alguns problemas financeiros que me levaram a aceitar um convite formulado por Luiz Ferreira, treinador vimaranense, para trabalhar com ele nas seleções da Hubei Football Association, como responsável pelo treino de guarda-redes. Em janeiro último, surgiu a oportunidade de ingressar num clube da Chinese League 2, embora continue ligado à Federação de Hubei.
Como está a correr esta última experiência na China?
A experiência tem sido bastante positiva, com os jogadores sempre muito recetivos à nossa forma de trabalhar.
No trabalho de campo, há muita diferença para o que é feito em Portugal?
A forma de trabalhar do treinador chinês é muito diferente do treinador português. Eles valorizam muito o físico. Nós olhamos mais para o trabalho técnico-tático. Mais direcionado para o jogo.
Quais as principais dificuldades de adaptação a novos países e culturas?
Eu adapto-me facilmente às diversas culturas por onde tenho passado. Em Omã sê omanita. Na China sê chinês. É o que tenho tentado fazer. Em Omã, comi com as mãos muitas vezes. Na China como com os pauzinhos. A maior dificuldade na China é a barreira linguística. A língua chinesa é mesmo muito complicada. Temos um tradutor que nos ajuda no treino e nos jogos, uma vez que são poucos os jogadores que falam inglês. Em Omã, a tarefa era mais fácil já que muitos jogadores falavam inglês e o árabe é um pouco mais simples de entender.
Onde vive, exatamente?
Neste momento estou em Wuhan. Cidade no centro da China, com 11milhoes de habitantes. Quando vim para a China não fazia ideia do país desenvolvido que a China é. Com infraestruturas modernas, vias de comunicação fantásticas, transportes, etc. Não preciso de conduzir. Utilizo o metro, táxi ou então a bicicleta. As deslocações para os jogos são quase sempre de comboio ou avião.
Com que frequência visita Portugal?
O problema da China é a distância. Isso impede-me de viajar para Portugal tantas vezes como fazia em Omã. Talvez consiga ir a Portugal uma vez, em julho, numa paragem do campeonato. A época desportiva aqui, em termos de calendário, é diferente da Europa. Começa em Março e termina em novembro.
Como se gere os milhares de quilómetros de distância, com a vida familiar?
As saudades da família dos amigos e de Portugal são muitas. Mas, felizmente, a Internet faz com que todos os dias consiga falar e ver a minha filha, a minha mulher, os meus pais, familiares e amigos.
Como é visto o treinador português lá fora. Concretamente no Médio Oriente?
O treinador português é muito bem visto em todo o mundo. Aqui na China não é exceção e, felizmente, o campeão da Liga chinesa tem como treinador o português Vítor Pereira. Situação que reforça ainda mais a boa imagem do treinador português que se adapta facilmente a qualquer contexto pois, em Portugal, as dificuldades nas condições de treino também são muitas. Tenho saudades de Portugal, da família dos amigos, da minha terra (Caldas das Taipas) mas, não tenho saudades do futebol português que continuo a acompanhar diariamente. Sinto-me valorizado no estrangeiro. Desde que saí de Portugal, as propostas de trabalho tem sido várias.
Alguma situação mais caricata que queira partilhar?
Das experiências extra futebol tenho vivido algumas engraçadas. Por exemplo, em Omã, fui a um casamento de um jogador onde não vi a noiva. Aqui na China, embora a gastronomia seja boa e diversificada, quando vejo na mesa alguma coisa que não me é familiar costumo perguntar o que é?!. Uma vez ia comendo tartaruga, sem querer.