21 dezembro 2024 \ Caldas das Taipas
tempo
18 ºC
pesquisa

Ter «memória de elefante» é um pesadelo?

Teresa Portal
Opinião \ sexta-feira, setembro 13, 2024
© Direitos reservados
Para mim, ter uma boa memória é uma vantagem, porque a equilibro, de forma positiva, com a capacidade de viver no presente e lidar com as emoções de uma maneira saudável. Como? Escrevendo.

Ter "memória de elefante" é ter uma memória excecionalmente boa, a capacidade de lembrar muitas informações, acontecimentos ou detalhes com clareza e precisão. Pode ser considerado positivo, pois uma boa memória pode ajudar em muitas áreas da vida;  nos estudos, no trabalho e nas relações humanas.

No entanto, existem algumas nuances a considerar. Por exemplo, pessoas com memórias muito boas também podem recordar acontecimentos traumáticos ou experiências negativas, que podem ser dolorosos. Para alguns pode mesmo ser um pesadelo, pois nem sempre é saudável ficar preso a detalhes do passado.

Esse não é o meu caso. O fio dos acontecimentos começa a desenrolar-se e vai construindo uma meada com nexo.

Para mim, ter uma boa memória é uma vantagem, porque a equilibro, de forma positiva, com a capacidade de viver no presente e lidar com as emoções de uma maneira saudável. Como? Escrevendo. O que é inútil ou supérfluo, ponho de lado. O que me interessa, escrevo sob a forma de crónica, de conto, de romance, até… de poesia. O papel é o meu psicólogo e desabafo com ele, dando saída às minhas vivências superando-as nas personagens e cenários que crio, quantas vezes baseados em factos e pessoas bem reais.

Todos os meus livros acabam por conter extratos da minha vida pessoal, social e profissional. E a ESCRITA aparece interligada com as outras artes, nomeadamente a pintura, a música sob as suas variadas formas (clássica, pop, rock) e expressões (ópera, balé, patinagem artística, canção, folclore)… Quantas vezes escrevo ao som da música clássica e fiz escrever. O sentido estético também se educa.

Escrevo desde sempre, em Português e em Inglês, embora estes últimos textos não sejam do conhecimento de ninguém, perdidos num blogue que tinha na altura e numa revista em Inglês na escola «THE KIDS». Trocávamos galhardetes, eu e a Delfina (delegada de Inglês). Ela escrevia para o Jornal Escolar O Pequeno Jornalista e eu escrevia para a revista.

Não é fácil reconhecer «a memória de elefante» e ela revela-se nas alturas mais inesperadas. Há que reconhecer e aceitar que, se sou o resultado das minhas vivências, então a memória influencia a minha maneira de ser e de pensar, Leva, sem dúvida, a um autoconhecimento que, por vezes, é de difícil aceitação. Há memórias marcantes e há que saber o porquê ou tentar saber, fazer luz sobre este ou aquele acontecimento que ficou gravado no «computador central».

Fala-se muito entre os escritores em «mindfulness», ou seja, estar no presente, meditar, focar no momento imediato e deixar o passado lá longe…

Nunca pratiquei ioga e, desde novita que tenho a capacidade de me desdobrar: eu sou eu e, simultaneamente, consigo sentir-me no papel do outro. Esse discurso interno ajuda a transformar memórias negativas em lições para a vida e faz com que seja realista não pessimista, como muitos julgam. Uma coisa é ser derrotista, estar sempre «down», outra é reconhecer que há momentos maus, mas que se vão superar mais cedo ou mais tarde. E isso acaba por me ajudar a superar o peso de recordações mais fraturantes.

Como é do conhecimento geral, gosto de conversar. Quando começo não acabo a não ser que me ponham um ponto final. No campo jornalístico (ensinei jornalismo durante 30 anos!), se é bom para um entrevistador ter um entrevistado que não responde monossilabicamente, por outro, tem de o dominar para que nem ele nem o outro percam o fio à meada. E conversar é uma ótima forma de deslindar meadas «trapalhonas» e de espairecer. Infelizmente, deixei de praticar o desenho, pois podia dedicar-me também a esse ofício. Quem sabe! Talvez um dia!

Um queixa atual e frequente é: não tenho memórias nem tenho criatividade. Mentira! Tudo vai de começar. Utilizem técnicas como: mnemónicas (usava tantas na escola e no liceu!), visualização e repetição. Peguem num caderninho de notas e comecem a tomar notas no café, na pastelaria, no parque, na praia… Inventem personagens a partir dos que estão perto de vocês ou longe, observem as nuvens e imaginam o que aquela especial poderá estar a dizer ao sol…

Eu tenho memória de elefante.

Para mim, ter uma boa memória é uma vantagem, porque a equilibro, de forma positiva, com a capacidade de viver no presente e lidar com as emoções presentes e passadas de forma saudável. Não tem sido uma jornada fácil, mas se fosse, qual era o interesse? Temos de ter objetivos na vida. Atingi-los e superá-los pode ser um desafio, mas a vida é um desfio constante.