Pegar o touro da crise
Não me assustam as palavras nem me assustam os atos. Assusta-me o que fica no meio… as meias palavras e os meios atos, porque indefinidos, incertos, indecisos e não levam a lado nenhum. Não são exemplificativos nem abonatórios, são destrutivos, lesivos e descaracterizados. Não são peixe nem são carne. Ficam-se talvez pelo bacalhau que conseguiu granjear uma categoria à parte, mas, ao contrário deste, que tem honras meritórias e gastronómicas que lhe reconhecem o estatuto, aquelas e aqueles ficam-se pela dúbia metade; não são, realmente, nada. Como se costuma dizer, são um zero à esquerda e à direita e eu atrevo-me a acrescentar também em cima e em baixo.
Na sociedade atual, a meia verdade alia-se à meia mentira, chamem-lhes as mentiras “falsamente brancas” ou negras (quanto a mim!). Eu explico: as ditas mentiras brancas não fazem mal a ninguém, são ditas precisamente para evitarem um mal maior, e as usadas pelos governantes são bem negras, pois fazem mal a toda a gente (menos aos que as dizem!). A mentira tornou-se política para ter sempre razão, pelo menos se estiver no poder ou no contrapoder.
Vivemos cada vez mais na incerteza, no dúbio, no que pode ser ou pode vir a ser ou pode não vir a dar coisa nenhuma.
Tal como as promessas que viraram meias promessas. Assim, nunca minto e nunca digo a verdade. Permaneço na zona cinzenta de segurança que as separa e faço acompanhar-me de uma moral que é, também ela, uma meia moral.
Acham alguns que é cómodo viver-se assim. Eu não acho. Sou muito “pão, pão, queijo, queijo”, o que é é e o que não é não é. Gosto do lado claro das coisas e de saber com que linhas é que me coso. Mas, como muita gente não sabe se se deixa coser ou cozer, se deve seguir este conselho ou o outro concelho, tudo vai servindo neste país tão luminoso e tão cheio de sol que costumava gostar de ver tudo claro e de ser a luz para os que o seguiam. Acredito que venhamos a ser um novo farol, talvez mais cedo do que muitos pensam.
Ainda não nos faltou o génio, a capacidade empreendedora e a de dar a volta por cima e de sair das situações mais negras, mais aflitivas. O desenrascanço está-nos na alma como se foi vendo ao longo deste difícil ano, tal como a saudade, e foram essas caraterísticas que, de braço dado, nos tornaram aventureiros e não nos deixaram baixar os braços, mesmo quando as hipóteses de vitória nos eram adversas. Não foi assim em Aljubarrota, em 1640, no 25 de Abril?
Então, resta-nos encarar a realidade com toda a verdade (se forem capazes de a dizer!), sem subterfúgios, cerrar fileiras e pegar o touro da crise, da nova crise provocada pelo maldito vírus e suas variantes e pela ameaça de uma terceira guerra mundial de caras, de cernelha, de que forma for, bem à portuguesa, embora haja interpretações bem diversificadas sobre a verdadeira realidade deste povo empreendedor.