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Liderar pelo exemplo

José Cunha
Opinião \ quinta-feira, janeiro 25, 2018
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Apesar da sua "enorme sensibilidade ambiental" e vontade de "preservar o que é essencial", o município investe milhões em estacionamento, demolindo edifícios.

Por assustador que possa parecer, pois pouco ou nada mudou (para melhor, entenda-se), foi já no século passado (1992) que uma menina de doze anos fez o emocionante e memorável discurso que silenciou os líderes mundiais presentes na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, naquela que ficou conhecida como a Cimeira do Rio (da Terra).

Nesse discurso, ela expõe a incoerência entre a palavra e a prática dos governantes, que apesar da consciência dos impactes das nossas ações sobre o ambiente, persistem, egoistamente, focados no crescimento económico e em agradar a quem os elege, remetendo os sacrifícios para as gerações futuras. Ela lembra que o pai lhe ensinou: "tu és o que fazes, não o que dizes!"

Lembrei esse discurso porque acredito que existe em Guimarães uma estirpe multirresistente desse vírus que afeta os governantes. Pelo menos foi essa a imagem que a minha imaginação projetou quando li recentemente algumas informações que fizeram chegar ao conhecimento público (desisti de lhe chamar notícias).

Assim, tivemos conhecimento que a CMG "desafia privados a transformarem edifícios fabris em complexos habitacionais", porque "há muita falta de habitação em Guimarães", mas "não é demolir! É manter a traça industrial na fachada".

Passou a ser também do nosso conhecimento que a CMG entende que "o investimento público serve para preservar o que nele é essencial", e que para ela "a área ambiental é de enorme sensibilidade".

Lembro que a habitação é um direito constitucional dos cidadãos, e que não existe qualquer direito ao estacionamento, mas perante as convicções da falta de ambos no centro da cidade, o município optou por satisfazer as não comprovadas necessidades de alojar os automóveis.

Pedem aos privados para investir em habitação, preservando os aspetos culturais dos edifícios, e certamente os espaços verdes envolventes.

No entanto, e apesar da sua "enorme sensibilidade ambiental" e vontade de "preservar o que é essencial", o município investe milhões em estacionamento, demolindo edifícios, destruindo e impermeabilizando terrenos com funções ecológicas de elevado valor.

Tu és o que fazes, não o que dizes!

Os políticos dizem que o mais importante são as pessoas, mas na realidade o que importa são os automóveis, ou lá o que for que eles entendam considerar como tal no calculismo orientado para o barómetro de satisfação dos eleitores.

Há quem acredite que isto nem com antibióticos lá vai, mas ainda assim, não custa nada lembrar o veemente apelo que a tal menina fez há vinte e cinco anos atrás:

"Por favor, façam com que as vossas ações reflitam as vossas palavras."

Nota: quem quiser (re)ver o vídeo do discurso, pode seguir este link (o vídeo está legendado em português) ou pesquisar por Severn Suzuki.