Estudando os alvores do convento de São Domingos
Arcarias góticas de acesso à sala do capítulo, sobrepostas pela escadaria moderna do convento de São Domingos de Guimarães
Foi realizada no corrente mês de Julho a intervenção arqueológica no antigo convento de São Domingos de Guimarães, que aqui tínhamos anunciado. Os trabalhos inserem-se no conjunto de melhoramentos que a Sociedade Martins Sarmento tem vindo a realizar no seu Museu Arqueológico, começando com as obras no piso superior do claustro, ainda em 2019, e no corrente ano a intervenção no piso inferior, com arranjo do pavimento das três alas cobertas, pintura das paredes e teto e conservação da ala Norte da arcaria do claustro, desprotegida pela inexistência de um piso superior deste lado.
As obras a realizar permitirão uma circulação mais cómoda no espaço do Museu, mas também uma reorganização das peças expostas, que integram, neste piso, mais de duzentos elementos da "Secção de Epigrafia Latina e Escultura Antiga".
O arranjo do pavimento justificou a realização de valas de sondagem prévias no sentido de perceber se as obras poderiam vir a afetar vestígios arqueológicos conservados sob o piso atual. Já a pintura das paredes motivou um registo dos alçados tal como se encontram.
Os trabalhos de escavação não revelaram espólio ou estruturas relevantes, incidindo sobre camadas de aterro e regularização recentes, com uma quantidade abundante de materiais de construção datáveis dos séculos XIX e XX. No entanto e pese embora o facto de serem camadas de revolvimento, foi possível recuperar elementos como fragmentos de louças, alguma faiança e azulejo, datáveis dos séculos XVIII e XIX, associados a um período em que o convento ainda estava em funcionamento. Mais interessantes são os poucos fragmentos de cerâmica datáveis dos séculos XIV/XV, testemunhos dos primeiros tempos de existência do mosteiro.
Contudo, o registo das paredes não rebocadas irá permitir uma esquematização dos espaços funcionais do convento na época em que primeiramente foi edificado. Embora os elementos registados se encontrem à vista há décadas (depois da remoção dos rebocos em meados do século XX) nunca tinham sido identificados numa perspetiva de estudo do espaço que, destinado à salvaguarda de bens patrimoniais, é também ele um monumento, a que se deve atribuir um carater singular.
De facto, são ainda visíveis os vestígios da original casa do capítulo, que estaria localizada a leste do claustro, abrindo para este através de um conjunto formado por um grande arco quebrado, ladeado por dois prováveis janelões, também ogivais. A localização do capítulo, bem como a solução de acesso, são idênticas à do mosteiro da Batalha, monumento que partilha outras características com São Domingos de Guimarães, sugerindo uma integração plena deste nos conceitos arquitetónicos e artísticos dos finais do século XIV. Também da sala do capítulo se identificou um provável arcossólio gótico.
Este espaço seria, na Idade Moderna, eventualmente no século XVII, reconvertido em espaço de escadaria, com acesso a um piso superior do claustro construído nesta fase e, num piso intermédio, o acesso à antiga capela de Nossa Senhora das Angústias. Foram assim refeitos os acessos do claustro para este compartimento, com portas mais baixas, condicionadas pelo piso superior, mas mantendo entaipados os arcos góticos originais, ainda visíveis.
A realização das obras, que deverá acontecer nas próximas semanas, terá também o necessário acompanhamento arqueológico, permitindo assim obter novos conhecimentos sobre este antigo convento dominicano.