COVID-19 - Arrendamento (rendas)
No meu último Quid Iuris dava aqui conta do Estado de Emergência que havia sido decretado a 18 de Março (e, entretanto, prorrogado, por mais 15 dias, a 2 de Abril), bem como de algumas medidas excepcionais e temporárias que haviam, entretanto, já sido decretadas pelo Governo de Portugal. Lembro-me também de ter chamado a atenção para outras que continuariam a ser tomadas, enquanto perdurasse a declaração de estado de emergência.
Uma delas surgiu logo uns dias depois: a Lei nº 4-C/2020, de 6 de Abril, veio estabelecer um regime excepcional na área dos arrendamentos urbanos, nomeadamente para as situações de mora no pagamento de rendas. E foi posteriormente regulamentada pela Portaria nº 91/2020, de 14 de Abril, no que respeita às formas de demonstração da quebra de rendimentos.
O decretamento do estado de emergência exigiu, efectivamente, a aplicação de medidas extraordinárias e de carácter urgente de restrição de direitos e liberdades, em especial no respeitante aos direitos de circulação e às liberdades económicas.
A Lei 4-C/2020, reconhecendo-se que tal contexto e circunstâncias especiais afectou fortemente algumas famílias, que viram diminuídos os seus rendimentos, veio estabelecer uma flexibilização no pagamento das rendas aos arrendatários habitacionais que tenham sofrido, de forma comprovada, uma diminuição de rendimentos como consequência directa das limitações que foi necessário decretar, para bem da Saúde Pública.
Ao mesmo tempo, aquela Lei veio permitir que o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I.P., possa conceder empréstimos, sem juros, para pagamento de renda a este tipo de arrendatários, bem como aos senhorios que, porventura, possam ficar em situação de carência económica em resultado da falta de pagamento de rendas pelos seus arrendatários. Por último, permitiu também que as entidades públicas com fogos arrendados possam, durante o período de vigência da Lei (que, adiante, especificarei qual é),suspender, reduzir ou isentar do pagamento de rendas os arrendatários que tenham, de forma comprovada, uma quebra de rendimentos.
Porém, esta flexibilização, aplicável aos arrendamentos habitacionais, implica que se verifique:
a) uma quebra superior a 20% dos rendimentos do agregado familiar do arrendatário face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
b) a taxa de esforço do agregado familiar do arrendatário, calculada como percentagem dos rendimentos de todos os elementos do agregado familiar destinada ao pagamento da renda, seja ou se torne superior a 35%; ou
c) uma quebra superior a 20% dos rendimentos do agregado familiar do senhorio face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
d) essa percentagem da quebra e rendimentos seja provocada pelo não pagamento de rendas pelos arrendatários ao abrigo do disposto na presente lei.»
Por outro lado, os arrendatários que se vejam impossibilitados do pagamento da renda têm o dever de informar o senhorio, por escrito (correio electrónico), até 5 dias antes do vencimento da primeira renda em que pretendam beneficiar do presente regime excepcional e provisório, devendo juntar a documentação comprovativa da situação, nos termos que infra analisaremos (da Portaria 91/2020).
Nas situações acima descritas de a) a d), e durante os meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente (final do período de vigência desta Lei), os arrendatários poderão efectuar o pagamento da(s) renda(s) no prazo de doze meses, contados do termo daquele período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, a pagar juntamente com a renda de cada mês. Não o fazendo, o senhorio terá o direito à resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas naquele período. Ou seja, para que o senhorio não tenha direito àquela resolução do contrato de arrendamento, o arrendatário terá de adoptar o procedimento acima descrito.
Relativamente aos arrendamentos não habitacionais (de estabelecimentos abertos ao público destinados a actividades de comércio a retalho e de prestação de serviços encerrados ou que tenham as respectivas actividades suspensas por força do estado de emergência; de estabelecimentos de restauração e similares, incluindo aqueles que mantenham actividade apenas para efeitos exclusivos de confecção destinada a consumo fora do estabelecimento, ou entrega ao domicílio), os respectivos arrendatários poderão também deferir o pagamento das rendas vencidas nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, para os 12 meses posteriores ao término desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, pagas também juntamente com a renda do mês em causa.
Aqui, contudo, verifica-se uma diferença em relação aos contratos habitacionais: a falta de pagamento das rendas que se vençam nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, nos termos anteriormente descritos, não poderá ser invocado pelo senhorio como fundamento de resolução, denúncia ou outra qualquer forma de extinção de contratos, nem como fundamento de obrigação de desocupação de imóveis, para além de que aos respectivos arrendatários não será exigível o pagamento de quaisquer outras penalidades que tenham por base a mora no pagamento de rendas que se vençam no período acima referido.
Sempre que se verifique o diferimento no pagamento das rendas, por atraso no pagamento das que se vençam nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, seja no âmbito dos arrendamentos habitacionais, seja dos não habitacionais, não será exigível a indemnização prevista no nº 1 do art. 1041º do C. Civil (20% do que for devido, do que estiver em mora).
A possibilidade de concessão de empréstimos, sem juros, pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana,I.P., encontra-se prevista no artigo 5º da Lei 4-C/2020 .
Nos termos da Portaria nº 91/2020, a quebra de mais de 20% decorrente de facto relacionado com a situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19, terá de ser demonstrada:
- no caso de arrendatários habitacionais, de estudantes e de fiadores, pela comparação entre a soma dos rendimentos dos elementos do agregado familiar no mês em que ocorre a causa determinante da alteração de rendimentos com os rendimentos auferidos pelos mesmos membros no mês anterior;
- no caso de membros do agregado habitacional em que a maior parte dos seus rendimentos derive de trabalho empresarial ou profissional da categoria B do CIRS, quando a facturação do mês anterior à ocorrência da quebra de rendimentos não seja representativa, estes poderão, então, optar por efectuar a demonstração da diminuição dos rendimentos com referência aos rendimentos do período homólogo do ano anterior, mantendo-se o regime acima referido para os restantes membros do agregado.
Os rendimentos de trabalho dependente serão comprovados pelos correspondentes recibos de vencimento, ou por declaração da entidade patronal;
Os rendimentos empresariais ou profissionais da categoria B do CIRS deverão ser comprovados pelos respectivos recibos, ou por facturas emitidas nos termos legais;
No caso de rendimentos de pensões, prediais, de prestações sociais, de apoios à habitação ou de outros rendimentos recebidos de forma regular ou periódica, os respectivos rendimentos deverão ser comprovados por documentos emitidos pelas entidades pagadoras ou por outros documentos que evidenciem o respectivo recebimento, nomeadamente obtidos dos portais da Aut. Tributária e Aduaneira e da Seg. Social ou ainda por declaração sob compromisso de honra do beneficiário, quando não seja possível de outra forma.
Por último, no caso de rendimentos dos senhorios, o não recebimento de rendas pelo senhorio será demonstrado por este através da correspondente comunicação do arrendatário.
Sempre que não seja possível a obtenção dos comprovativos do valor dos rendimentos dos profissionais da categoria B do CIRS, dos pensionistas, dos rendimentos prediais, de prestações sociais ou de apoios à habitação, os rendimentos respectivos poderão ser atestados mediante declaração do próprio, sob compromisso de honra, ou do contabilista certificado, no caso de trabalhadores independentes no regime de contabilidade organizada.
A entrega ou subscrição de documentos que constituam ou contenham falsas declarações, responsabilizará os seus emitentes por danos que venham a ocorrer, bem como pelos custos incorridos com a aplicação das referidas medidas excepcionais, sem prejuízo de outro tipo de responsabilidade gerada pela conduta, nomeadamente criminal.
As comunicações entre os arrendatários e os senhorios e, se for o caso, para o IHRU, I.P, deverão ser preferencialmente realizadas por correio electrónico.
Proteja-se, a si e aos outros. Fique em casa!