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Obras pararam mais de dois meses e Câmara culpa falta de materiais

Tiago Dias
Sociedade \ quarta-feira, agosto 11, 2021
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A empreitada na área que terá a ribeira da Canhota a céu aberto já recomeçou, após transtornos provocados aos comerciantes. Domingos Bragança e AICCOPN falam de subida dos preços dos materiais.

As retroescavadores já giram os braços de um lado para o outro, enquanto os trabalhadores alinham as guias dos futuros passeios na extremidade nascente da avenida da República, com vista para os Banhos Velhos e para a Pensão Villas. Essa é uma visão em marcha desde a última semana de julho, após uma interrupção de cerca de dois meses. Além do trânsito cortado – está assim desde 19 de abril -, os acessos para peões eram difíceis e pouco percetíveis, segundo os comerciantes da zona; comerciantes esses que desesperaram face à perda de clientela e naturalmente de receitas.

Os rumores de eventuais explicações para o problema andaram de mão de dada com a inquietação sentida no coração da vila termal. Já a Câmara Municipal de Guimarães, promotora da intervenção, resume os atrasos a uma grande causa: faltam materiais de construção.

“Há falta de pedra, de vidro, de madeira, para não falar na falta de profissionais. A prorrogação de prazo é o dia a dia não só de Guimarães (…). Nas Taipas, é simples: o lajeado mais importante ninguém o fornece”, justificou o presidente durante a reunião do executivo municipal decorrida na quinta-feira de 29 de julho.

Domingos Bragança reconheceu ainda que falta basalto, um dos materiais previstos para a nova versão do centro cívico, e que já foi pedida aos arquitetos a “substituição de materiais”, algo que, a seu ver, exige cuidados; o Reflexo tentou contactar a arquiteta que projetou a obra, Marta Labastida, até para perceber os fundamentos da interrupção, mas sem sucesso.

Iniciada em 19 de outubro de 2020, com um orçamento de 4,7 milhões de euros, a requalificação do coração das Taipas padece dos mesmos obstáculos de outras intervenções no concelho; deu os exemplos da rua Engenheiro Duarte do Amaral, entre Fermentões e São Lourenço de Selho, do Teatro Jordão, cujo término estava originalmente previsto para 2020, e da rua D. João I, à qual faltaram, a certa altura, as principais lajes de granito.

Numa reunião anterior, a vice-presidente do município, Adelina Paula Pinto, referira o atraso na entrega de materiais de construção como uma das razões para a interrupção da empreitada. As eventuais descobertas arqueológicas, com a necessária inventariação, poderiam igualmente contribuir para o atraso, admitiu.

 

Oscilação de preços tem sido o dia a dia da construção

O acesso aos materiais de construção faz-se hoje num cenário de “total imprevisibilidade”, com “dificuldades nas cadeias logísticas” e “oscilações diárias de preços”, esclareceu ao Reflexo a Associação de Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN).

A subida de preços tem sido “abrupta e muito significativa” no aço, no cobre, no alumínio, na madeira e em produtos derivados do petróleo, como os betuminosos, causando “fortes disrupções em toda a cadeia de produção e distribuição”, acrescentou o presidente da associação, Manuel Reis Campos. “O preço do varão de aço para betão, “Steel Rebar”, na London Metal Exchange (LME), fechou a 29 de julho com uma variação de 72,6%. Os contratos de alumínio e de cobre da LME cresciam cerca de 52% no mesmo período”, frisou, a título de exemplo. O “aumento exponencial dos custos” não pode ser assim considerado um “risco próprio e normal do negócio”, com que “qualquer empresa deve razoavelmente contar”.

A construção civil tem-se ainda ressentido da pandemia – medidas de confinamento, restrições à circulação e necessidade de cumprir todas as normas de saúde e segurança representam uma “importante perda de produtividade e de rendimento”, aponta Manuel Reis Campos – e da falta de trabalhadores que já se verificava antes da difusão do novo coronavírus. “No setor da construção e do imobiliário identificava-se, ainda antes da pandemia, a falta de 60 a 70 mil trabalhadores. É preciso apoiar a qualificação das empresas e a reorientação da formação profissional para que seja possível ultrapassar as dificuldades”, defende a AICCOPN.

 

 

A oeste… nada de novo

Na outra extremidade da avenida da República, o trânsito circula em ambos os sentidos, com viaturas estacionadas pelas beiras. Não há ainda sinais que denunciem a transformação daquele núcleo urbano a curto prazo, a não ser os das ocasionais trocas de palavras entre quem por ali anda. Um dos lugares privilegiados para dois dedos de conversa enquanto se compra um jornal, um maço de tabaco ou uma raspadinha é o Quiosque Jardim; está ali implantado desde o início da década de 70 e é gerido por Miguel Silva há 40 anos.

O proprietário já está acautelado para o “pandemónio” que se vai sentir quando as obras arrancarem na zona e diz não hesitar em fechar o estabelecimento se os rendimentos caírem abruptamente, inviabilizando os pagamentos a quem ali trabalha. “Se não der, porta fechada. Não hesito. Embora esteja em meu nome, estou a trabalhar para a minha família. Do que ganho aqui não quero nada”, diz o responsável, de 70 anos.

O projeto da Escola Arquitetura da Universidade do Minho aponta o quiosque como um dos elementos urbanos que distinguem o coração da vila e Miguel Silva acredita que o edifício vai permanecer onde está. Tenciona até fazer uma requalificação do espaço se assim for, embora tema perda de clientela com a alteração do trânsito para sentido único. “Se puserem o trânsito num sentido e deixarem um sítio para se estacionarem carros a cinco ou 10 minutos para qualquer compra, tudo bem. Se deixarem tudo fechado, não adianta nada”, frisou.

Ao lado, Manuel Oliveira contempla o seu táxi enquanto espera por clientes; está nesse ofício há 40 anos, sempre nas Caldas das Taipas. Diz não saber nada quanto às condições futuras projetadas para os taxistas. Ainda do tempo em que a praça se localizava junto à pastelaria Central, Manuel Oliveira recorda que os taxistas nunca reclamaram da falta de condições, mesmo quando foram colocados junto ao Quiosque Jardim, numa medida então anunciada como provisória. “Nunca nos lamentámos. Na altura em que estávamos acolá [junto à pastelaria Central], era o Remísio [de Castro] presidente da Junta e ele disse-nos que vínhamos para aqui provisoriamente, por três ou quatro meses. Já estamos aqui há 20 anos”, diz o trabalhador natural de São Martinho de Sande.