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Molinhas, uma casa de campeões que se ergue a saltar à corda

Tiago Dias
Desporto \ domingo, março 16, 2025
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Criado há 10 anos, o clube de rope skipping ganhou impulsão para as vitórias com “conhecimento e rigor” nos treinos e expande-se no número de atletas depois da contração imposta pela covid-19.

Ao anoitecer, dezenas de crianças e adolescentes refinam os movimentos com a corda, em velocidade ou em coreografia (freestyle), articulando-se com os colegas de escalão no multiusos da Escola Secundária de Caldas das Taipas. O treino dos benjamins − nove aos 11 anos – está a cargo de Gabriel Ferreira. Ligado ao rope skipping desde 2009, com um currículo que inclui títulos europeus como atleta, o treinador de 26 anos assistiu à fundação do Molinhas – Clube de Rope Skipping das Taipas, a 12 de fevereiro de 2015, e exprime com clareza aquilo que ele significa. “Os Molinhas são a minha casa. Cresci nas Taipas. Os meus colegas são os meus amigos de sempre. Cresci com o desporto. Só fazia sentido estar neste clube”, afirma ao Reflexo.

Uma década depois de se abrirem as portas dessa casa, Gabriel hesita na hora de escolher o momento que mais o marcou: mais do que os títulos como atleta e os sucessos do clube a nível continental, prefere realçar os desempenhos dos seus pupilos nos campeonatos nacionais, o culminar de cada ano competitivo. “É acabar a época da melhor forma, porque os meus atletas conseguem mostrar o que treinamos no ano todo. É muito especial”, confessa.

 

“O clube sempre foi o nosso suporte. Estamos sempre juntos. Somos como uma família. Passo mais tempo com as pessoas do Molinhas do que com a minha família”, Catarina Guimarães, ex-atleta e treinadora

 

Ligada à modalidade há tanto tempo quanto Gabriel, Catarina Guimarães ressalva o título nacional de 2015 – era então atleta –, como “um grande momento” vivido ao serviço dos Molinhas, emblema que assinala um antes e um depois na prática do rope skipping na vila termal. “Os Molinhas vieram trazer uma grande diferença estrutural e logística, maior organização. Começamos a praticar muito mais regularmente, a um nível que não praticávamos antigamente”, descreve a treinadora de 26 anos.

Uma das principais obreiras do trabalho em curso há 10 anos é Sandra Freitas, professora de educação física e presidente do clube desde praticamente a sua fundação. Nascida e criada nas Taipas, a dirigente reconhece que assistir ao vivo ao recorde europeu em single rope 4x30, assinado por Paulo Lima, João Vieira, Fernando Ferreira e Hugo Soares, a marcou. “As outras participações internacionais vivi-as à distância. Esta foi a única em que consegui estar presente. Foi o momento que mais me marcou”, assume, a propósito do campeonato da Europa de 2024, na Hungria, onde os atletas do clube alcançaram 14 medalhas, cinco de ouro.

 

Da Escola Básica à covid-19

Caldas das Taipas começa a saltar à corda em 2009, na Escola Básica, por iniciativa de Nuno Dias. Entusiasmado com o rope skipping após uma formação com uma equipa belga, o professor de educação física reuniu um “grupo pioneiro”, que incluía Gabriel e Catarina, à época alunos do 6.º ano. “Tudo começou com algumas brincadeiras. Os restantes professores de educação física também se entusiasmaram e formalizaram a Associação Portuguesa de Rope Skipping em 2011”, descreve a presidente dos Molinhas.

Face ao crescente interesse na modalidade, Nuno Dias apresentou uma proposta para a integrar no CART. Assim aconteceu, antes de se perceber que “a modalidade precisava de estar num clube próprio, para traçar objetivos e ir buscar apoios”. Especializada em voleibol, modalidade que ajudou a reintroduzir no CART em 2008, Sandra Freitas lecionou em escolas de Leiria e do Algarve, antes de regressar a casa, focada numa modalidade em que Caldas das Taipas já conquistara títulos europeus. “Estava muito interessada em fazer crescer uma modalidade nova, em fazer parte da história e do seu crescimento no país”, confessa.

Face aos projetos de Nuno Dias em clubes de Braga, Sandra liderou a criação dos Molinhas, em parelha com Ângelo Santos, marido e professor de educação física com “bagagem competitiva” que incluía treino de atletas olímpicos de badminton. Ainda que nenhum fosse especializado em rope skipping, reuniam conhecimento de treino, de organização e gestão desportiva.

A prioridade inicial era a de reunir o maior número de atletas possível, com vista “a uma base suficientemente alargada” para enveredar pela competição, mas os primeiros resultados internacionais, com um título de sub-18 logo em 2015, por Fernando Ferreira, mostraram que havia margem para trabalhar com “mais qualidade” e alcançar sucessos “com consistência”. A base dos Molinhas cresceu até aos 70 saltadores, antes do abalo de 2020, ditado pela covid-19. “Fomos para os 33 atletas. Um ou outro atleta decidiram experimentar outras modalidades, e está tudo bem, porque estão a praticar desporto. Muitos perdemos para o sofá. São as perdas que mais nos custam”, descreve.

 

“Uma família” a crescer de novo

Ultrapassada a pandemia, os Molinhas encetaram uma retoma que os aproxima dos 70 atletas. Ainda mais animadora é a taxa de retenção “relativamente alta”. “Entre quem vem experimentar, oito em cada 10 ficam. Estamos a ficar muito fortes nos escalões mais novos”, resume Sandra Freitas. Entre os pioneiros do rope skipping nas Taipas, o desígnio para o futuro é devolver ao clube parte daquilo que já lhes deu.

Ligada à European Rope Skipping Organisation (ERSO), experiência que lhe dá “capacidade organizativa e de gestão, relações e contactos”, Catarina quer elevar a modalidade em Portugal, sem esquecer a “segunda casa”. “O clube sempre foi o nosso suporte. Estamos sempre juntos. Somos como uma família. Passo mais tempo com as pessoas do Molinhas do que com a minha família”, frisa. Da parte de Gabriel, também está preparado para os saltos que aí vêm: “Fui atleta, sou treinador e espero um dia conseguir ajudar na organização do clube”.